segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

O vício dos livros

Adoro livros, pura e simplesmente adoro-os. Há momentos em que vou às livrarias e apetece-me comprar toneladas deles... Noutros momentos, em que quero comprar realmente um, parece que nada me chama... E nunca têm o que eu queria ver... 
Passo perfeitamente bem uma infinidade de horas numa grande livraria, vagabundo de corredor em corredor, de prateleira em prateleira, de lombada em lombada, tentando perceber qual me chama, qual o que deve ir para casa comigo...
Quando me sinto mais cansada, às vezes tenho vontade de me atirar para cima de um expositor cheio de livros, e dormir uns minutos em cima de todos eles... Cheira-los, conta-los, toca-los, sonha-los... 
Hoje acordei a pensar em livros... Dá para reparar não é?
Acordei e pensei, «tenho saudades de ler algo verdadeiramente viciante»... 
Já vos aconteceu? Ler um livro tão viciante, que à noite não conseguem fecha-lo, sabem que têm de madrugar na manhã seguinte, que vão acordar com uma enorme dor de cabeça por só dormirem três horas mal dormidas, e com uns horríveis olhos inchados, e com um cansaço no corpo que vos faz sentir miseráveis o dia todo... Mas mesmo assim, não conseguem fechar o livro... E quando por esgotamento total, os olhos já não conseguem ler nem mais uma palavra, porque todas as letras dançam, uma dança do ventre, fechamos finalmente o livro... E adormecemos? Qual quê! Damos voltas e mais voltas na cama, pensado e repensando o que irá acontecer aquelas personagens, o que estará a acontecer? Então, ligamos mais uma vez a luz e dizemos «vou ler só mais cinco páginas...», enquanto na nossa cabeça o bom senso liga o alarme «já devias estar a dormir, amanhã vais estar que nem podes, és mesmo parva, fecha isso, já nem consegues ler, DORME!». E tanto nos chateia a voz da nossa consciência, que acabamos por ceder.
Mas o vício não termina aqui... Mal adormecemos e já estamos dentro do livro, a sonhar com as personagens, a dar um rumo à história...
E quando o relógio desperta às sete da manhã, temos uma dor de cabeça inimaginável, e mesmo assim, somos tentados a abrir o livro, para ler nem que seja duas páginas, nem que tenhamos de sacrificar o nosso delicioso pequeno almoço de café instantâneo e bolachas maria...
Já vos aconteceu o semelhante?
Se sim, digam-me, e digam-me com que livros, porque sinto imensa falta de me sentir assim... 
A última vez que isto me aconteceu, foi à sensivelmente uma ano atrás, em que li uma trilogia, de um escritor sueco, Stieg Larsson, cujos títulos são, "Os Homens que Odeiam as Mulheres"; "A Rapariga que Sonhava com uma Lata de Gasolina e um Fósforo"; e "A Rainha no Palácio das Correntes de Ar", isto na tradução portuguesa, claro, que às vezes deturpa títulos, de uma forma hilariante! Não sei quem se lembra de pôr títulos tão diferentes dos originais! Mas pronto, pormenores!
Como eu estava a dizer, foi à um ano que tive a experiência maravilhosa de andar dias de olhos inchados, por causa de uma trilogia, tão viciante, e como vos digo, estou com saudades!
O Stieg Larsson, ia escrever dez volumes, mas não sei o que é que lhe deu, e morreu!! Não se vicia desta forma os leitores, para depois morrer! 
Mas enfim, agora só me resta esperar pelas vossas sugestões de livros, que me tirem o sono, e a razão!  

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

noite e dia

Os dias passam a um ritmo que não consigo entender... Já não distingo as horas e o que que elas querem dizer... Não há distinção entre noite e dia... Existem planos, coisas que gostava de fazer, coisas que tenho de fazer... Elas são o meu relógio... O problema é que não avançam... Estão como num limbo, nunca passando para o plano da concretização... O meu tempo em coisas para fazer não passa, parece que ainda está tudo num único dia... Mas na verdade, na verdade já passaram milhões de dias, milhões de noites, que só distingo porque muda a cor do céu...
E os dias enrolam-me e embalam-me na sua doce melodia... E por aqui ando eu, como uma folha ao vento, numa eterna deambulação...  

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Pequenos nadas

Dedico este texto à minha querida prima Susana.

Serão as pequenas coisas que animam o nosso quotidiano? Que pequenos prazeres são estes que nos parecem mágicos? O mundo feminino está repleto de cheiros, brilhos, cores, texturas, fitas, pedrinhas, sonhos num pequeno pote de rouge
Como podem todas estas coisas serem tão preciosas, e terem um impacto tão grande no humor e imaginário das mulheres?
Um pouco de rouge no rosto, um gloss brilhante nos lábios, e umas vaporizadelas do nosso perfume favorito, e sentimo-nos outras, como se a nossa auto-confiança aumentasse logo com estes pequenos rituais…
E todas podemos desfrutar deles, absolutamente todas podemos ter orgulho de despertar a nossa feminilidade… O nosso romantismo…
Podemos trazer a feminilidade à flor da pele, torna-la tão sedosa como uma pétala de rosa, podemos despertar de novo o gosto de prepararmos bolinhos para o amor da nossa vida, e quem sabe até aprendermos a lhe tricotar um cachecol, muito mais valioso do que qualquer um que possa ser comprado na mais cara das lojas… Isto é fazer renascer a feminilidade nas pequenas coisas, criar pequenos prazeres feitos pelas nossas próprias mãos, numa era em que tudo é feito em serie, sem a impregnação da mais pequena gota de amor.
Não podemos deixar os nossos sonhos presos num pequeno pote de rouge. Nós conseguimos ser tudo aquilo que quisermos ser… não podemos ter medo de nos descobrirmos e às nossas imensas potencialidades, é preciso gosto, orgulho, dignidade, e nada das desculpas de que não há tempo para cuidar de nós, ou que não temos dinheiro suficiente para nos pormos nas mãos de profissionais em SPAs
Pequenos rituais diários, pequenos cuidados com nós mesmas e transformamos logo o brilho da nossa aura…

domingo, 5 de dezembro de 2010

Luzia

- Porque não escreve? - Perguntou-lhe, numa tarde quieta, de doce intimidade, essa querida amiga, cujo nome era Maria Amália Vaz de Carvalho.
- Porque me falta tudo o que é necessário para fazê-lo, desde a gramática, ciência com que nunca consegui entrar... até o tempo...
- Sem a gramática, passa-se admiravelmente. Eu também nunca a aprendi, declarou, impagável de seriedade, a minha doce amiga - mas quanto a faltar-lhe o tempo, permita-me que duvide... Não tem casa, deveres de família, nenhum trabalho obrigatório...
- É por isso mesmo, minha querida senhora. Não há ninguém tão «affairé» como um ocioso... ocupação tão absorvente como a de não fazer nada...
- Mas experimente fazer alguma coisa...
- É tarde demais. Habituei-me a esta vida inútil, vazia...
- Porque diz o que não sente? Eu sei que sofre, que precisa de um interesse... trabalhe. Comece já hoje...
- Tenho um «bridge».
- O «bridge»  não a contenta...
- Diverte-me.
- Acho pouco. Melhor companhia lhe fará a pena...

Luzia abanou tristemente a cabeça, sem confessar à amiga que o conselho, que lhe dava, fôra o mais ardente sonho de mocidade. 
Luzia nasceu escritora, como tantos nascem poetas, pintores ou actores. Mas teria morrido, sem escrever, não fosse o suave aguilhão da querida amiga. 

in "Luzia, o Eça de Queiroz de Saias" de José Martins dos Santos Conde. 

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Gosto

Gosto de escrever, do cheiro dos livros, de encadernações bonitas. Gosto de construir histórias, de pormenores, da riqueza existente no dia-a-dia. Gosto da beleza, de fitas de veludo e de cetim, das flores, das cores, dos perfumes e texturas. Caixinhas, contas, dourados, prateados. Sonoridades. Fado. Poesia. Leituras recheadas de pormenores, rituais, beleza, encantamentos, culturas. Gosto de paixões, emoções, magia. Rituais que transformam um dia. Gosto de cantar. Roupas com pequenos apontamentos de cor, portais para quem acredita em sinais. O cuidado perfumado do corpo, os cabelos a brilhar. Presentes construídos ou embrulhados com as nossas próprias mãos. Um bolo a fumegar. O cachecol para tricotar. A casa para enfeitar com bolas e grinaldas de Natal. Gosto das histórias de encantar, de ilustrações que fazem suspirar. Gosto de gatos enrolados na minha barriga. De chocolate quente com chilli. De frasquinhos de compotas caseiros. De óleos para massajar. Gosto de amor e acredito no príncipe encantado. 
O que eu gostava mesmo era de salpicar a vida das pessoas com magia, com cores, com cheiros, fazê-las ficar de olhos a brilhar, sorriso nos lábios, e a prestarem atenção aos sinais mágicos do Universo. Fazê-las acreditar que tudo é possível, e que há paixões para voltar a despertar.

Somos deus no nosso pequeno mundo inventado...

O nosso pequeno mundo inventado... Quantas construções em paralelo não nos trespassam a mente? Quantos pequenos segredos, falas, julgamentos, vozes temos em nós? Quanta magia pomos no que nos rodeia, com aquela vozinha que faz eco dentro da nossa cabeça? Até onde voamos? Voamos... Voamos... Estamos no café, sentados sozinhos, a saborear o nosso quente e forte expresso, num momento ouvimos os ruídos do que nos rodeia, sentimos o calor da chávena na mão, o sabor do café, e no momento seguinte já lá não estamos... Como um passe de mágica somos transportados até ao nosso pequeno mundo inventado, onde somos deus, pois são as nossas árvores, os nossos rios, os nossos personagens que vemos, com quem conversamos, que inventamos... Ora passeamos por um jardim, com um lago brilhante, como passeamos por uma praia de mar negro, como já estamos a imaginar mil desfechos para um problema, ou situação que temos para viver...
Consigo estar horas sentada sem fazer nada, e sem me aborrecer... Fico alienada no meu mundo, como costumo dizer, gosto de perder-me nas ruas das minhas cidades... E é uma alienação, ou não... Quem sabe aquela é a minha realidade, que eu mexo, movo, crio, faço, desfaço, enalteço, destruo, reconstruo, em tons de brilho, em tons de noite, em tons de luz...
Como é bom vaguear, alienar-se, perder-se... No mundo das ideias, dos conceitos, da imaginação... Brincar com todos eles, pensa-los, redescobri-los...
Que mágica é a palavra... Com ela somos deus no nosso pequeno mundo inventado...

Associação Livre

Dá-lhe, um mar, marcador, naquele avião cor-de-rosa, o cavaleiro andante mergulhou, não sabia que peixe podia encontrar, que demónio o podia conduzir, naquela noite, em que a mulher de pele cor de cera e toque de seda falou, uma incandescência vermelha jorrou, na noite escura. Quem és tu? Perdeu-se na noite, no escuro, na sua vida, sem armadura, completamente sem armadura ficou, sem nada, e com medo, até que um dia, nem o medo restava, nem a armadura, deu-se de conta que era livre, tão livre, que nem sabia o que fazer com aquele sentimento. Misturava-se com tudo, com aquela árvore de flores pequeninas, na minha cabeça não sei se eram flores cor-de-rosa, ou brancas, se era uma amendoeira em flor, ou uma cerejeira. Como eu adoro cerejas, é como aquela explosão, vermelha. E foi um autêntico galopar, um dissolver-se com tudo, com a terra, com o céu com o mar. E a minha Marília voltou, a minha personagem Marília, que um dia voou. Estava livre, sem prisões sem amarras, sem medos, leve como uma pena.
O café estava empestado de nuvens de cigarro, o cheiro a café à mistura, naquela noite, soava o jazz, e Pedro Albuquerque estava sentado a um canto, estava completamente longe, a sua mente divagava, divagava mais para lá de qualquer coisa sólida, pensava em pensar, pensava no vazio, ficou preso numa outra dimensão, e foi aí que ele viu, um cavalo completamente cor-de-rosa, um bonito cavalo, cor de rosa… em que espécie de dimensão estou? Ao lado uma menina, uma menina que irradiava luz, de vestido cor-de-rosa, cabelo aos cachos e olhos cor de chocolate, segurava uma enorme nuvem cor-de-rosa de algodão doce. Passava um rio ao lado, de pedras estranhas que se viam através da água translúcida. O mais surpreendente é que apareceram dois cagados cor-de-rosa. Até que uma nuvem negra apareceu, a menina se enfureceu, os seus cabelos se revolveram no ar, e o seu cavalo cor-de-rosa, negro ficou. Alguém partiu um copo e Pedro Albuquerque voltou à realidade onde o seu corpo estava presente, o café, a nuvem de cigarros, a surrealidade de tudo aquilo.
Vejo paralelos, vejo um carro, vejo uma descida, a criação da mente é fantástica, a imaginação, as personagens, os relatos, vive-se várias existências, somos deus no nosso pequeno mundo inventado… será que a nossa vida é fruto de um deus escritor? Será que estamos inseridos no seu mais árduo romance, na sua ficção? E que o que nos acontece são os meros devaneios de um deus escritor? Serão os nossos dramas, simples escolhas para apimentar um romance?